17.5.14

 
Autógrafo sem data


No final do autógrafo, o velho pede – grita − pro escritor não pôr a data. E sai arrastando a perna bem devagar.

Mas tem que ir mais rápido. Precisa ser rápido. A perna não deixa, não quer, não vai. A rua, reta pra todos, pra ele inclinada e afrontosa. Não tem tempo a perder. “O metrô não fecha à meia-noite?”. São dez e meia ainda. “Tenho tempo de sobra.”

Não. Não tem. Há os malditos degraus. A ida até a bilheteria. A moça que vai perguntar algo que ele não ouve direito. A catraca que nunca libera o cartão de primeira.

“E se eu tivesse furado a fila? Velhos não podem furar a fila? Dizer qualquer merda e querer ser atendido primeiro?” Todos esperam que um velho (“eu?”) faça ou diga alguma merda. Como essa besteira de pedir (“EU GRITEI?”) pra não pôr a data.

Pra que isso? Vai vender o livro depois? Leiloar se o escritor morrer?

“Sim, vou ganhar uma boa grana. Se eu não fosse morrer primeiro.”

Se ele tivesse mais tempo. Se conseguisse sair completo até deste conto mal acabado.

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